domingo, 26 de fevereiro de 2012

ao que uma tarde me oferece.


Naquela mesa onde sou detido pelo tempo, estou como aparência feita realidade da montra do café. Dos que me lançam o olhar, apenas retenho névoa passeante e liberto-os no ímpeto. Ao gesto cândido de beber o café, admito-me leitor em primazia do que me servirá de alva.
Ai, sempre me revi neste amplexo de gesto pardo, onde o mais simples do momento me poderia assistir ao primordial do medo.
Um tempo feito forma, uma verdade feita incógnita que se despede em passo lento. As vozes que ali habitam arrumam tempos idos, agasalham os verbos e o sussurro é livre audácia do que ainda acreditam ser o imaginável.
Eu, como figura, desprovido da caracterização, alinhado num silêncio arbóreo, detenho-me na horizontal alegria de ainda querer respirar segredos. Admitindo as vezes que se repetem os gestos, que eternizam a melancolia, que lhe dão impiedosa reminiscência e nos fazem coabitar tão largas avenidas acreditando na primeira vez como plenitude.
Naquela mesa onde ainda digo, tempo, aparo o meu brilho, para retomar a senda.

3 comentários:

Anónimo disse...

Que maravilha,de regresso aos textos poéticos.
Tentarei não perder nenhum.

Anónimo disse...

POSSIBILIDADES

Prefiro cinema.
Prefiro os gatos.
Prefiro os carvalhos nas margens do Warta.
Prefiro Dickens a Doistoievski.
Prefiro-me gostando dos homens
em vez de estar amando a humanidade.
Prefiro ter uma agulha preparada com a linha.
Prefiro a cor verde.
Prefiro não afirmar
que a razão é culpada de tudo.
Prefiro as excepções.
Prefiro sair mais cedo.
Prefiro conversar com os médicos sobre outra coisa.
Prefiro as velhas ilustrações listradas.
Prefiro o ridículo de escrever poemas
ao ridículo de não escrever.
No amor prefiro os aniversários não redondos
para serem comemorados cada dia.
Prefiro os moralistas,
que não prometem nada.
Prefiro a bondade esperta à bondade ingénua demais.
Prefiro a terra à paisana.
Prefiro os países conquistados aos países conquistadores.
Prefiro ter abjecções.
Prefiro o inferno do caos ao inferno da ordem.
Prefiro contos de fada de Grimm às manchetes de jornais.
Prefiro as folhas sem flores às flores sem folhas.
Prefiro os cães com o rabo não cortado.
Prefiro os olhos claros porque os tenho escuros.
Prefiro as gavetas.
Prefiro muitas coisas que aqui não disse,
e outras tantas não mencionadas aqui.
Prefiro os zeros à solta
a tê-los numa fila junto ao algarismo.
Prefiro o tempo do insecto ao tempo das estrelas.
Prefiro isolar.
Prefiro não perguntar quanto tempo ainda e quando.
Prefiro levar em consideração até a possibilidade
do ser ter a sua razão.

Wislawa Szymborska, in "rosa do mundo" assírio & alvim, 2001

Anónimo disse...

que desconsolo, vir aqui espreitar e não haver novidades.....